escultura de tatti moreno, salvador, 2012
“Visto da rua o prédio não parecia tão grande. Ninguém daria nada por ele. É verdade que se viam as filas de janelas até o quarto andar. Talvez fosse a tinta desbotada que tirasse a impressão de enormidade. Parecia um velho sobrado como os outros, apertado na Ladeira do Pelourinho, colonial, ostentando azulejos raros. Porém era imenso. Quatro andares, um sótão, um cortiço nos fundos, a venda do Fernández na frente, e atrás do cortiço uma padaria árabe clandestina. 116 quartos, mais de 600 pessoas. Um mundo. Um mundo fétido, sem higiene e sem moral, com ratos, palavrões e gente. Operários, soldados, árabes de fala arrevesada, mascates, ladrões, prostitutas, costureiras, carregadores, gente de todas as cores, de todos os lugares, com todos os trajes, enchiam o sobrado. Bebiam cachaça na venda do Fernández e cuspiam na escada, onde, por vezes, mijavam. Os únicos inquilinos gratuitos eram os ratos. Uma preta velha vendia acarajé e munguzá na porta. Do quarto andar desciam as vezes sons de violão e árabes trocavam língua no silencio dos quartos sem eletricidade. Mulheres do terceiro andar discutiam com mulheres do segundo e ouviam-se palavras cabeludas. De manhã, os homens saíam quase todos. O vozerio das mulheres aumentava. Lavavam roupa. Ruídos de máquinas de costura. A tosse de uma tuberculosa no sótão. Os homens voltavam à tarde, cansados. A escada os devorava um a um”(Jorge Amado, Suor, 1934).
Nenhum comentário:
Postar um comentário